ROBERTO VIEIRA
Primeiro de maio de 1941.
Getúlio chuta a bola de futebol. Prefere o golfe, mas hoje não pode errar. Um, dois, três chutes e a bola vai na direção da cama, finalmente. O discurso está pronto também. É o primeiro dia da Justiça do Trabalho na história do Brasil.
O Estado Novo é a alternativa ao comunismo e ao fascismo. A resposta brasileira e lusitana nos tempos de guerra.
Mas o povo brasileiro ama mais o futebol do que ele poderia imaginar. Bom.
O Departamento Nacional de Trabalho tem a idéia de ressuscitar o duelo Norte e Sul do Distrito Federal. Há dez anos não ocorre um prélio entre atletas das duas regiões do Rio de Janeiro. Getúlio gosta da idéia do jogo. Só desconfia daquela idéia do pontapé inicial. Prestes não chutaria essa bola jamais.
Para a festa do Dia do Trabalhador no estádio de São Januário teremos dois juízes. O policial Mario Vianna apita o primeiro tempo. Fioravante D'ângelo fica com a segunda etapa.
A zona sul escala Batatais, Norival e Machado; Procópio, Jaime e Afonsinho; Sá, Zizinho, Dr. Carvalho Leite, Geninho e Hércules. Os aristocratas Botafogo, Flamengo e Fluminense prestando homenagem ao suor. O time se dando ao luxo de deixar Tim na reserva.
A zona norte alinha Chiquinho, Jaú e Florindo, Otacílio, Bibi e Argemiro; Roberto, Lelé, Isaías, Jair Rosa Pinto e Orlando. Um poderoso conjunto com defesa vascaína, extrema da seleção e do São Cristóvão, ataque dos três históricos patetas do Madureira.
Antes do jogão e do discurso de Vargas, tempo para o pop torneio com Metalúrgicos x Fábrica Bangu e Indústria de Calçados x Ferroviários.
Na tarde ensolarada carioca, ginastas e desfiles suásticos e preliminares stalinistas convergem para o chefe de governo perfumado e sorridente que desce ao gramado, cumprimenta Carvalho Leite e Jair, toca na bola sob aplausos delirantes e se cala ante a ausência do presidiário Leônidas.
O jogo? Espetacular. Hércules abre o marcador e Isaías vira para 2x1. Diante da multidão extasiada as equipes se revezam no marcador com show de Zizinho e Carvalho Leite até que o ponta e futuro médico baiano Pedro Amorim marca o sexto da zona sul e Isaías anota mais dois gols pra zona norte fechando o placar em 6x5 para a zona sul.
Como joga esse Isaías... se ao menos fosse branco!
Fogos, bandeiras, cartazes, bonde e a pé. Os trabalhadores do Brasil acreditam no futuro da pátria. Getúlio recebe a notícia que os metalúrgicos perderam da Fábrica Bangu por 3x2 e os ferroviários da Leopoldina ganharam dos fabricantes de calçados na diferença de escanteios - sim foram jogos com regras dos torneios inícios.
Não que Getúlio esteja preocupado com o futebol ou as festividades.
Os jornais anunciam as vitórias do Eixo. Os EUA se mantém neutros. Talvez seja realmente necessário apoiar Adolf Hitler.
O mundo nesse primeiro de maio parece uma terra fértil para Adolfs, Benitos, Francos e Salazares adeptos de estádios e multidões apaixonadas.
Melhor assim.
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