24 de dez. de 2016



Por ROBERTO VIEIRA

Noite de Natal de 1916, Recife.

A Missa do Galo termina no Largo da Paz em Afogados. Manoel de França lembra de Maria, a filha de Antônio Cató. A menina de treze anos tira seu sono e o pai dele jurou tirar a vida de Manoel se chegasse junto dela. Cató era pescador antigo, amigo de todo mundo na beira mar da praia de Boa Viagem, mas Manoel achava que Cató não sabia com quem ele estava se metendo.

As ruas de Afogados se iluminam com fogos. As famílias comemoram a esperança do Natal. A Guerra está do outro lado do mundo. O Brasil está comemorando em cada largo da Paz pelo país.

A cachaça desce mais amarga naquela noite para Manoel. José ri do comparsa - 'tu tá ficando mole, Manoel!'

Manoel ouve aquilo e sente que precisa dar um jeito em Cató. Não se desafia um sujeito como ele e a vida prossegue como se nada houvesse acontecido. O punhal está na cintura, a noite é de festa, Cató não imagina que algo poderia acontecer no dia de Natal.

Manoel deixa os amigos de crimes e se benze na frente da Igreja de Nossa Senhora da Paz.

O caminho até Boa Viagem tem escuridão e mangue. Pensamentos e a garrafa de cachaça que vai tomando pra tomar coragem.

Quatro da manhã e os primeiros pássaros começam a cantar. Antônio Cotó abençoa os filhos que dormem e se apronta pra enfrentar o mar. Vai em busca do sustento da família e de algum dinheiro pra melhorar a janta do Natal. Um vulto se aproxima naquele final de madrugada.

'Cotó!'

Antonio Cotó tem apenas o tempo de erguer os olhos e avistar os olhos do assassino. Os lábios só conseguem murmurar duas palavras no segundo final da existência quando percebe quem é o vulto e o que carrega nas mãos:

'Nossa Senhora!'

Um golpe apenas é desferido em Antônio Cotó. A rede cai na areia defronte da casa humilde do pescador. Manoel larga o punhal e corre na direção ~do vazio de Boa Viagem em 1916.

Antônio Cotó chama pela esposa. A família chega e assiste o momento final do pescador. Ele ainda tem forças para abraçar sua filha.

Nunca mais se ouviu falar de Manoel de França...


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