14 de nov. de 2016



 Por LUCÍDIO JOSÉ DE OLIVEIRA, MDM

Eu já vi muito jejum em futebol. Mais de 60 anos de janela e quantos padecimentos vi e acompanhei!
Vi o Vasco da Gama padecer 10 anos com a Praga de Arubinha. Um fato histórico. Foi assim: com um timaço de primeira, que tinha craques como Itália, Niginho e Feitiço, o Vasco jogava com o Andaraí, um dos últimos da tabela. Jogo noturno nas Laranjeiras, na época o melhor campo da cidade. Na ida para o estádio, um acidente de trânsito envolvendo o ônibus da delegação, fez o time do Vasco chegar atrasado ao local do jogo. O Andaraí, pelo regulamento, tinha o direito assegurado de ganhar os pontos por “desistência do adversário”, a tal lei do WO. O time do Vasco não tinha dado as caras na hora do jogo. Fim de papo. Mas houve compreensão dos dirigentes e o jogo terminou acontecendo assim mesmo, começando tarde da noite, entrando pela madrugada. Mas o Vasco não quis conversa: 12x0 no placar! Arubinha, ponta-esquerda do time suburbano, um cara que sabia das coisas, sabia ler e escrever, tinha alguma liderança, era o capitão do time, não se conformou. O Vasco poderia ter vencido de 1x0, ganhava o mesmo número de pontos, na época apenas dois. Não precisava ter exagerado. Rogou a praga. E para materializá-la, logo depois do jogo, voltou escondido a São Januário e valendo-se da escuridão da noite, enterrou um sapo atrás de uma das barras, precisamente na que tinha entrado a maioria das bolas da enxurrada de gols. Que o Vasco ficasse onze anos sem ganhar nada, cada ano pagando pelo excesso de gol, os gols além da conta, desnecessários e humilhantes. E assim foi. O Vasco só voltou a ser campeão na década seguinte, em 1945, e assim mesmo, conta a lenda, porque os dirigentes vascaínos conseguiram convencer Arubinha a ir até São Januário para retirar o sapo de debaixo da terra, somente ele sabia onde o bicho tinha sido enterrado. A praga ficou valendo menos, somente por oito anos... É o primeiro jejum que entrou para a história.
Vi também os 23 anos de jejum do Corinthians, mais que os 21 que exige a maioridade civil, com o histórico gol de Basílio feito aos 38 minutos do segundo-tempo, no nervoso jogo contra a Ponte Preta em 1977 no Morumbi. E ainda hoje penso assim: aquele gol que saiu depois do chute do nosso Luciano Maravilha na trave, teria na verdade acontecido se o adversário fosse o São Paulo ou o Palmeiras? Sei não... O jejum ia continuar
Vi e acompanhei o próprio Palmeiras viver logo depois, 17 anos de agonia. Praga de corintiano, naturalmente. Até que em 1993 voltou a ganhar um campeonato. Não acontecia desde o distante 1976, véspera do jejum do Timão.
E aqui no nosso futebol também vi e vejo ainda coisas acontecendo.
Vi o Santa Cruz passar dois longos períodos seguidos de 10 anos cada, de jejum. De 1947 a 57; o outro, de 59 a 69.
Vi o Sport ficar 12 anos longe do título, por pouco não passando a se chamar Leão XIII, nome de time de Usina, vendo o Náutico ser Hexa e o Santa Cruz ser penta, ele que só sabia o que era ser tri. E só saiu da fila sabe Deus como! Com a rufinada encomendada, acontecimento histórico exemplar de o quanto pode a patifaria do extra-campo.
Agora, estou vendo esse escândalo mundial: a Argentina, até há poucas semanas líder do ranking da Fifa, 23 anos sem ganhar nada! A Argentina de Messi! E isso depois de Messi, aos 17 anos, ter levado seu país ao título de campeão olímpico de futebol. E ser ele quem é: cinco vezes melhor do mundo, quatro vezes artilheiro da Champion, campeão todo ano, duas três vezes por ano, anos seguidos, mas pelo seu Barcelona. Com a Argentina, nada!
O pior de tudo vem no fim: vi e continuo vendo o meu Náutico há 14 anos sem saber o que é vencer uma competição! E de que vale o consolo de que não houve impedimento na Pajuçara? Nem falta e nem pênalti na Ressacada? O que fica para a história é o jejum. Na história oficial não se fala em rufinadas. Isso não existe no dicionário dos canalhas. É preciso muito amor ao futebol para continuar acreditando. E ao time que a gente escolhe desde criança para continuar torcendo. Continuar acreditando é que é o duro. E o danado é que eu acredito... Acredito e torço! Um dia acontece!
(Esse texto é, claro, um desabafo. De que adianta mais de 25 mil na Arena, dando show? Só serve para “legitimizar” a patifaria. Jogo de cena. Assim como o 1x0 não garante nada, um lance fortuito, um pênalti arrumado pode permitir o empate, no campeonato precisa ser competente para abrir vantagem e não dar bandeira para a patifaria. Assim como fez esse ano o Atlético de Goiás. Para o Náutico, a receita passava por não perder os pontos incríveis que perdeu lá atrás, na era Gallo).


0 comentários:

Postar um comentário

Comentários