27 de fev. de 2016






Por LUCÍDIO JOSÉ DE OLIVEIRA, MDM    




O tempo era o dos pentagonais e das extras. E das decisões por pênaltis. Das fases e dos turnos que eram decididos pelos grandes frente a frente em finais que se repetiam. Campeonatos longos que se arrastavam por meses, uma decisão atrás da outra. O que não faltava era emoção. Ganhava nem sempre o melhor, mas aquele que aproveitava melhor esses momentos.

O Clássico dos Clássicos do dia 12 de agosto de 1984 na Ilha do Retiro foi um desses jogos. Era a decisão do 1º turno. Jogo parelho, pau a pau, disputado até o derradeiro instante. O tempo normal terminou igual, 1x1 no placar, gols de Heider para o Náutico quando o relógio marcava a primeira meia hora de jogo, e de Careca, empatando, já na segunda fase. Empate dava prorrogação. Náutico e Sport foram para os trinta minutos decisivos, com dois tempos de quinze.

Começou a prorrogação, e o Sport afinal botou frente, 1x0, gol de Bianchi. Eram passados apenas quatro minutos. O time do Sport era muito bom. Um time que começava com o goleirão País, uma garantia. E passava pelos zagueiros Gomes e Alex, pelo volante Merica, e pelos atacantes Luiz Carlos, o goleador do time, e o arisco, driblador e também artilheiro Joãozinho, ponta esquerda dos bons. Mas a sorte esteve manifestadamente a favor do Náutico naquele dia. O empate na prorrogação veio no último toque de bola, na última volta do ponteiro, os segundos se esgotando. Nem sequer foi dada nova saída. A decisão foi para os pênaltis. E novamente a sorte estava ao lado do Náutico: 4x3 na cobrança dos tiros diretos da marca da cal.   

Na realidade, era uma parada perdida, o placar adverso no finalzinho da prorrogação. A maioria da torcida timbu já tinha abandonado a Ilha, levada pela mão da velha e inseparável parceira dos últimos noves anos, a frustração de perder todos os jogos decisivos. Muitos já haviam deixado o estádio, juntavam-se à procissão dos aflitos. E poucos foram os que tiveram coragem de voltar.

É importante recordar o quadro de desespero: um lateral favorável ao Náutico estava para ser cobrado pela direita do ataque, quando estoura um tumulto daqueles, envolvendo jogadores alvirrubros, juiz, bandeirinha, o banco do Sport. Parecia o fim de tudo. Não havia tempo para mais nada. O artilheiro Baiano já se apercebera de que nada mais poderia ser feito e passava na cara do árbitro Marquezine que o Náutico “tinha perdido o turno”vejam bem, perdido o turno, tudo estava sendo dado como perdido, porque ele, o juiz, e seu auxiliar, tinham garfado o time alvirrubro (os gravadores dos repórteres captaram tudo bem nitidamente; claro que no lugar de garfado, a palavra era outra...). Na verdade, o Náutico tivera um gol erroneamente anulado, um impedimento que não existiu. Marquezine, inclusive, deu o gol, voltando atrás para atender o bandeirinha. Pois bem, o lateral é cobrado depois de muita espera. Muitos pensavam que o árbitro ia dar o jogo por encerrado ali, naquele momento, antes da cobrança do lateral. Bola em jogo, ela é lançada na área, e lá vai encontrar o predestinado Baiano. Meio desequilibrado, num chute fraco, o artilheiro coloca a redonda mansamente no canto direito do goleiro País.

Brilhava mais uma vez a estrela de Baiano. Um gol de sorte feito no finalzinho.

Na decisão por pênaltis, mais emoção. De um lado, o goleirão País; do outro, o campeão do mundo Mazaropi. Além do título um ano antes em Tóquio, pelo Grêmio, Mazaropi tinha a seu favor um recorde no futebol carioca, 1.816 minutos sem levar gols em jogos de dois campeonatos seguidos (77-78), ainda que entre um certame e outro tivesse sua meta vazada em jogos do campeonato brasileiro. De todo modo, um recordista. Pois bem, no final da disputa, Náutico 4x3 Sport.

Mazaropi, o goleiro campeão do mundo, havia defendido incrivelmente duas das cinco cobranças. A estrela do espetáculo já não era mais o artilheiro Baiano. Um valor mais alto se alevantava. A estrela agora era ele, Mazaropi, o goleiro milagroso do dia. Na disputa, tinha ganho a parada para País.

O Náutico contou com a sorte, sem dúvida. Sem ela não teria sido campeão do 1º turno. Seria o campeão, como na realidade o foi, depois de nove anos de jejum, no final da temporada? Só os deuses do futebol sabem responder.

A nós, mortais, cabe apenas aplaudir. Ou chorar. E admitir que para cada milagre em campo, existe por trás um santo que se encarrega de sua materialização. Aqueles que revelam para nós, torcedores, seus milagrosos lances em momentos decisivos. E por tudo que aconteceu naquele fim de tarde, pelo que fizeram Baiano e Mazaropi naquele Clássico dos Clássicos de agosto de 84, não haveria exagero nenhum, para a torcida timbu, que fossem os dois heróis inscritos como santos milagrosos nos cânones do futebol.  


Um comentário:

  1. Santos milagrosos. Como todos os santos. São Mazaropi e são Baiano. Santos alvirrubros. E amanhã, na mesma Ilha? São Júlio e são Daniel. Quem viver, verá!

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