Por CARLOS HENRIQUE MENESES, MDM
Chegou o momento de se fazer uma homenagem e um agradecimento ao goleiro campeão pernambucano de 1974. Como se diz no futebol, “todo grande time começa com um grande goleiro”! E naquele ano o Náutico montou um grande time, só comparado à seleção de craques da época do Hexa. Faltava o grande goleiro.
Com a chegada do técnico Orlando Fantoni vieram com ele alguns jogadores do futebol de Minas Gerais, tais como Juca Show, Pedro Paulo, Cincunegui, Lima, e Neneca.
Neneca tinha feito um excelente trabalho em 1973 jogando pelo América-MG, e a proposta do dirigente alvirrubro Sebastião Orlando era muito boa, tanto profissional, como financeiramente. Afinal, tinha completado 26 anos e já era tempo de fazer um bom contrato.
Sua chegada foi discreta, mas as primeiras imagens do homem foram assustadoras. De feições sérias, poucas vezes abria um sorriso, jeito humilde, 1,83m de altura e chuteiras 45. Dava medo cruzar com ele à noite.
Natural de Londrina-PR, Neneca começou a carreira de goleiro aos 10 anos de idade no campo do time amador da Ferroviária Londrinense. Jogava de atacante e estava com a perna quebrada. Um belo dia faltou um goleiro e ele foi deslocado para o gol, mesmo com o gesso na perna. Pegou tudo naquele dia. Assim que foi liberado pelo DM recebeu a camisa 1, e nunca mais a largou.
Neneca jogou 107 jogos pelo Náutico, nos anos de 74 e 75. Foi campeão pernambucano em 1974, onde levou apenas 5 gols em todo o campeonato, e de quebra bateu o recorde mundial de permanência sem levar gols. Foram 1.636 minutos, mais de 18 jogos, sem tomar gols, recorde brasileiro e mundial à época.
Suas atuações eram fantásticas. Bastante seguro, tanto nas bolas rasteiras, como nos cruzamentos na área, Neneca passava para todos nós uma tranqüilidade sem tamanho. Se alguma bola entrasse no gol do Náutico, era porque nenhum outro goleiro poderia defendê-la. Sua reposição de bola era um verdadeiro contra-ataque. Seu chute na devolução de bola em jogo saía da grande área do Náutico, e só batia de novo no chão na meia lua de grande área do adversário. Vários gols de Paraguaio e Jorge Mendonça saíram dos seus pés.
No início do ano de 1976 Neneca foi vendido ao Guarani de Campinas. Foram 5 anos vestindo a camisa do Bugre campineiro. Neneca foi campeão brasileiro de 1978 pelo Guarani, numa memorável final contra o Palmeiras. O gol do título feito por Careca surgiu de um “passe” (chute) de Neneca. Naquele ano Neneca chegou a ficar 778 minutos sem levar gols.
No ano de 1981 o goleirão voltou para defender o Londrina, e conquistar o campeonato paranaense. Ao encerrar a carreira de jogador profissional, continuou jogando futebol pela Seleção Brasileira Master de Futebol, patrocinada pelo empresário e locutor Luciano do Valle, tendo sido campeão Mundial Master de Futebol.
Nos anos 90 passou a ensinar crianças e jovens a serem goleiros, e foi treinador de goleiros do Londrina. Foi quando em 1996 pude rever o grande ídolo. No dia 4 de dezembro jogaram Náutico e Londrina nos Aflitos, pela Série B do Brasileirão. Ao vê-lo entrar no gramado dos Aflitos fiquei de longe admirando os seus passos, e relembrando os bons tempos passados de 74 e 75.
No ano de 2010 Neneca foi homenageado pela Câmara de Vereadores de Londrina, quando recebeu o Diploma de “Reconhecimento Público”, pelos relevantes serviços prestados à coletividade londrinense. O prefeito da cidade na ocasião disse: “essa é uma pequena homenagem diante da grandeza da carreira vitoriosa do ex-goleiro, e do quanto ele divulgou o nome de Londrina para todo o Brasil”!
Em conversa recente com o amigo Ademar Lucena, ex-goleiro do Náutico, e contemporâneo de Neneca, pude ouvir uma das histórias mais engraçados do futebol. Ela se passou no ano de 1975, quando Neneca era o goleiro titular, Luiz Fernando o reserva imediato, e Ademar, recém saído das divisões de base era o terceiro goleiro.
Depois de mais um exaustivo treino comandado pelo Titio Fantoni, muita água e laranja eram consumidas pelos atletas. Em seguida os jogadores se dirigiram para os vestiários dos Aflitos. Conta Ademar que, Neneca estava tomando banho naqueles chuveirões dos vestiários, um vão com 5 ou 6 duchas, todo ensaboado, quando o zagueiro Djalma Sales passa discretamente a mão na “bunda” do goleirão. Foi o suficiente para transtornar o homem. Neneca saiu nu, todo coberto de espuma, correndo pelos vestiários atrás de “pegar” o Djalma Sales. Foram necessários 5 jogadores para “segurar” o Neneca, que saía “escorregando” feito muçum por entre os jogadores.
O Djalma Sales teve que jurar que nunca mais faria uma brincadeira daquelas com o goleiro Neneca. Em seguida, a paz voltou a reinar nos Aflitos.
Porém, de todas as histórias sobre o Neneca, a que mais me emocionou não foi a do título de 74, nem o recorde mundial sem levar gols, muito menos a do título brasileiro pelo Guarani em 78. Ela vem de antes, muito antes, quando ainda jogava pelo América-MG, num jogo contra o Botafogo pelo Brasileirão de 73.
Momento antes do jogo Neneca recebeu a notícia do falecimento do seu querido pai, aquele que mais o incentivava na profissão de jogador de futebol, e na posição de goleiro. O seu Joaquim Miguel, que tinha 56 anos, havia deixado precocemente essa vida. O técnico Fantoni foi o responsável por dar a notícia e liberá-lo do jogo para ir ao enterro.
Chorava Neneca, chorava Fantoni, choravam os jogadores do América nos vestiários. Depois de alguns minutos de choro e soluços, Neneca enxugou as lágrimas e disse: “meu velho colocava o trabalho em primeiro lugar. Era um homem simples e humilde. Tio, deixa eu jogar, pois vou trabalhar como o papai gostava”!
Neneca entrou em campo, fechou o gol, e o América ganhou o jogo por 1x0 do Botafogo-RJ. Foi escolhido o melhor jogador em campo. Recebeu todos os prêmios de todas as emissoras de rádio que transmitiam o jogo. Já nos vestiários, ajoelhado diante da imagem de Nossa Senhora, Neneca, o goleiro de 1,83 metros, e chuteiras 45, chorou!
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