25 de abr. de 2021



 


Por ROBERTO VIEIRA

O casal senta junto no consultório. Nem se falam. As diferenças tão grandes que nem vale a pena discutir. Mas o diagnóstico é sombrio. Pelos velhos tempos o marido achou por bem vir junto à esposa.


Há uma chance. A cirurgia pode garantir uma sobrevida atualmente, por vezes ocorre a remissão total do câncer. Porém, é apenas uma chance, normalmente as metástases vêm e com elas a morte.


O médico lembra do casal. Eles eram alegres e felizes no início. Chegavam sorridentes, espirituosos, cheios daquela alegria dos apaixonados. 


O médico fala do prognóstico e dos cuidados pré e pós operatórios, lembrando que casamento e cirurgia têm muito de... futebol. 


O casal parece não entender. Casamento e cirurgia têm muito a ver com futebol? Vá lá que o médico seja apaixonado por futebol... mas a comparação é absurda. Pra não dizer inadequada naquele momento de dor.


Ante o olhar crítico, meio de incredulidade do casal amigo, o cirurgião explica pela enésima vez o que a profissão e os campos de futebol haviam lhe ensinado. 


O amor é como um grande clube de futebol que decide contratar dois craques de bola. Quando jornais e torcedores recebem a notícia, o prognóstico é imediato: o time será campeão!


Porém, após as primeiras vitórias, o time começa a empatar, tropeça nos lanternas, leva uma goleada, ninguém se entende. Parece até que os craques desaprenderam a arte de jogar bola.


Como sempre se faz nessas horas, troca-se o técnico e algumas vezes o conselho de um determinado técnico faz toda diferença. A equipe entra nos trilhos. O time volta a ser forte e vencedor. Mas o que será que este técnico aconselhou? Qual a estratégia, a tática, as jogadas ensaiadas?


Ora, bolas! Nada de tão espetacular ou esotérico assim. Uma conversa franca e fraterna que só funciona quando os dois jogadores desejam que funcione. 


Futebol e casamento são jogos de equipe. Nenhum cônjuge e nenhum jogador ganha um jogo sozinho. Cada um dos jogadores possui qualidades especiais necessárias à equipe. Cada um dos cônjuges possui virtudes e defeitos pois são humanos. 


Quando decidem atuar em uma equipe ou quando escolhem viver juntos, cada pessoa ou atleta entrega a seu time ou casamento o que tem de melhor. Muitas vezes o suor de alguém proporciona que surja o talento do companheiro. Outras vezes, o sacrifício do talento auxilia o trabalho operário do cônjuge. 


Quando um falha, o outro ajuda para que tudo dê certo. Quando alguém perde um gol feito, o outro lembra que sempre haverá outra chance e que tudo vai dar certo. Quando quem defende, falha, o outro surge na cobertura. Toda vitória é uma vitória de todos. Toda derrota, também. 


Não existe graça ou felicidade no jogo jogado sozinho. A alegria está em dividir os noventa minutos da vida com nossos companheiros. Muitas vezes somos campeões, noutras não. Mas o que realmente importa é jogar esse jogo chamado VIDA juntos.


E quem já amou e quem curte futebol, sabe muito bem. O jogo só acaba no apito final. 


No futebol e no casamento, as maiores equipes da história caminharam juntos no bom e no pior, na alegria e na tristeza, na riqueza e na pobreza. 


E assim se tornaram imortais.


O casal compreende e se abraça. Se despedem prontos a jogar o jogo mais importante das suas vidas.


No consultório agora vazio, o velho médico segura aquele retrato antigo. A velha companheira de milhares de jogos olha pra ele na eternidade. Como se nunca houvesse dito adeus.



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