3 de fev. de 2014






Por ROBERTO VIEIRA


Eram alunos de um colégio católico e outro batista. O bairro onde se localizava a Igreja de Santa Cruz transpirava ídiche, sendo a nova pátria de centenas de judeus oriundos do leste europeu. Ambiente tão democrático só podia terminar em Paixão...


Todos eles jovens.

O mais velho com quinze anos.

Rasparam os bolsos e o resultado foram três mil e quinhentos réis.

Dava pra comprar um picolé pra cada um.

Augusto Dornelas pergunta qual vai ser o nome de batismo.

O sino anuncia dezenove horas.

O novo clube passa a se chamar Santa Cruz Football Club.

O sonho pega fogo na rua da Mangueira, nº2.

O Santa Cruz seria o clube de todos os sonhos.

E Lacraia seria a prova disso.

Lacraia que era o apelido de Teófilo Batista de Carvalho.

Lacraia que era filho de médico, mas possuía um defeito congênito.

Era mulato.

Um pecado no futebol sem cor da década de 10.

Mas cadê Lacraia?

Lacraia não está no dia da fundação.

Está estudando para o vestibular de engenharia.

Luís Barbalho redige a ata.

Caligrafia esmerada.

José Luis Vieira é eleito o primeiro presidente.

Por um motivo prosaico.

Luís Vieira era o único que ganhava algum trocado no comércio.

O Santa Cruz será preto e branco.

Preto e branco vai assombrando os outros times.

Disparando goleadas em quem passa pela frente.

Ganhando fãs na massa que se enxerga no sonho dos meninos.

Preto e branco que impera até 1915.

Quando o Santa Cruz teve de mudar suas cores.

O Flamengo do Recife já era preto e branco – dava confusão.

Conversa de cá e de lá.

O Flamengo do Rio passa de navio por Recife.

Dezembro.

Flamengo que vai de Píndaro e Welfare enfrentar a seleção do Pará.

Uma certa ‘Taça Jornal Folha do Norte’.

Flamengo que usava o vermelho, preto e branco.

Estava decidida a questão.

O alvinegro Santa Cruz se torna tricolor.

E tricolor seguiu seu caminho nas ruas e becos pernambucanos.

Santa Cruz de Tará e Tiano.

Santa Cruz de Marias e Josés.

Santa Cruz dos Coelhos, do Coque, do Beberibe.

Santa Cruz que de tão pobre era negado mil vezes pelos ricos que torciam por ele.

Santa Cruz que apenas Sherloque pode explicar.

Santa Cruz da Maravilha do Arruda e de Caça Rato.

Santa Cruz de Ramon batendo Pelé.

Santa Cruz que um dia decidiu contratar Moacir Barbosa.

Goleiro da seleção de 50.

Santa Cruz que não tinha um vintém na carteira.

Santa Cruz que pagou Barbosa passando a cestinha nos mocambos de Recife.

Naquele dia.

Muito moleque pegou o dinheiro do picolé e depositou na cestinha.

Porque o Santa Cruz sempre foi assim.


Um sonho de meninos transformado em Paixão... 


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