26 de jan. de 2014





Por VALDIR APPEL, MDM


Marcial, o goleiro de gelo. Recentemente assisti o trailer do filme The Iceman, e embarquei outra vez no túnel do tempo. Cheguei ao Rio de Janeiro nos anos 1965, para servir o exército. Levava na memória as transmissões dos jogos do campeonato carioca, ouvidas ao pé de um rádio valvulado, na minha pequena Brusque. As imagens dos craques, dos gols, das defesas, do público nas arquibancadas se materializavam na voz dos narradores: Jorge Curi, Valdir Amaral, e nos comentários de João Saldanha e Rui Porto. O eu goleiro, levava na mochila estas lembrança, a vontade de ver os jogos ao vivo, e a esperança de ser tão bom goleiro, como Manga e Marcial. Manga, meu ídolo maior, eu enfrentei, e de Marcial eu tive a oportunidade de ouvir muitas histórias, derramadas nas periferias do Rio de Janeiro. Histórias que revelavam a qualidade explicita deste mineiro desprovido de vaidades, que jogava sem luvas, sem espalhafatos, com um adequado uniforme preto, e cabelos esvoaçantes. Segundo os relatos, era ungido de uma frieza glacial, revelada numa empolgante final de campeonato. Iniciou a carreira no Galo das Alterosas, fez história no Fla. Chegou a seleção e passou pelo Corinthians. Conquistou títulos, antes de retornar a Belo Horizonte, onde encerrou prematuramente a carreira. Trocada sem lamurias e arrependimentos por um diploma de anestesista. Na conquista do título carioca de 1963, quando o Fla Flu decisivo levou ao Maracanã um público recorde de mais de 170 mil torcedores (público este, jamais batido na disputa entre dois clubes brasileiros), aflorou toda a sua frieza, calma, equilíbrio e domínio das ações. O jogo estava dramático para os rubro-negros e o seu goleiro fazia milagres. O zero a zero dava o título ao Fla. O coração dos rubro-negros já estava saindo pela boca. Nos minutos finais, após realizar mais uma defesa extraordinária, num chute de Escurinho, Marcial ergueu-se para os aplausos e aproximou-se lentamente do lado direito da sua baliza, e num gesto impensado, arremessou a bola contra o poste quadrado de madeira. A bola quicou no meio da barra e voltou obediente às suas mãos. O susto causado, dizem, levou muito torcedor a festejar o título num pronto socorro mais próximo do Maracanã.


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