24 de nov. de 2008



Por ROBERTO VIEIRA

"Volver a los diecisiete

después de vivir un siglo

es como descifrar signos

sin ser sabio competente..."

Março de 1980.

O Brasil é o silêncio dos generais e das ruas.

Nas entrelinhas, chega ao Recife o ex-líder sindical Manoel da Conceição para fundar o PT em Pernambuco.

Com ele, o líder metalúrgico Luís Inácio da Silva.

PT que reuniu 300 militantes no Centro de Trabalho e Cultura.

Do outro lado, chega José Sarney. Vem fincar as raízes do PDS.

Sarney que reuniu os amigos na Assembléia Legislativa.

Por caminhos diversos, Lula e Sarney chegariam ao Palácio do Planalto.

[IMAGEM]

Nos jornais, um pequeno aviso: A tucumana Mercedes Sosa vai cantar no Geraldão.

Lembrando aqueles tempos, voltamos a nos sentir profundos, frágeis como um segundo.

Voltamos a ouvir as canções de Violeta Parra na voz de Mercedes Sosa.

Voltamos a um tempo onde o sonho havia morrido, nas palavras de John Lennon.

Lennon que foi se juntar ao sonho, meses depois.

Porque ter dezessete anos no Brasil de 1980 era confiar em Telê Santana.

Telê que assumiu a canarinha naquele mês.

Cortando, de cara, o goleiro Leão.

Mero futebol?

Não.

Telê concede uma entrevista ao jornalista Gilson Vieira do Diario de Pernambuco com a seguinte frase:

"Não sou torturador!"

Sinal do tempos.

[IMAGEM]


Porque ter dezessete anos no Brasil de 1980 era ler sobre uma bomba em Brasília.

Bomba descoberta momentos antes da palestra do antigo militante Gregório Bezerra.

Bomba revidada com outra bomba, descoberta no Aeroporto dos Guararapes em Recife.

Bomba cujo alvo era o ministro da Educação Eduardo Portela.

Embora esta segunda bomba não fosse bomba.

Fosse apenas uma pedra.

Coisa de quem queria empatar o jogo em 1 x 1.

Porque ter dezessete anos no Brasil era curtir Mulher Nota 10.

Ou aguardar a liberação do filme Z, de Costa-Gravas.

O show de Mercedes Sosa foi silencioso.

Uma briga com os jornalistas causou o boicote no noticiário.

O sistema de som perdeu-se na imensidão do ginásio do Geraldão.

Geraldão que recebeu um pequeno público alternativo.

Público de jeans, camisas velhas e cabelos ao vento.

Nada que se comparasse a multidão do show de Rick Wakeman um ano depois.

Recife ouviu clássicos como 'Gracias a la vida' da chilena Violeta Parra.

Recife ouviu e calou-se, na memória dos anos em que Recife era livre.

E o Recife foi dormir em silêncio.

Mas não era o silêncio dos generais e das ruas.

Era o silêncio de um menino de dezessete anos.

Condenado a sonhar.

Novembro de 2008.

Vinte e oito anos depois, o menino tem cabelos brancos.

Contrastando com os cabelos negros eternos de Mercedes.

E o Recife encontra-se novamente com Mercedes, graças a vida.

Esta senhora indomável, dona do tempo.

Vida que através da arte nos faz decifrar a própria vida.

Sem sermos sábios, competentes.

Apenas com o coração...




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